“Sabão pedacinho assim
Olha água um pinguinho assim
Do tanque um tanquinho assim
A roupa um tantão assim”
No Brasil escravista, surgiu no cenário urbano a figura dos escravizados de ganho, que prestavam serviços na cidade. Eles davam a maior parte do dinheiro que ganhavam para seus senhores, mas ficavam com uma parcela, um pouco do lucro ou o excedente das vendas.
Podiam guardar esses recursos para usar como quisessem, e até comprar sua alforria. No entanto, isso não era comum, pois as alforrias custavam caro e dependiam da concordância dos proprietários. As mulheres negras, pós-escravidão, continuaram desempenhando as mesmas funções que tinham antes.
Deixaram de ser escravas domésticas para continuarem a exercer trabalhos precarizados, como de lavadeiras, cozinheiras, babás, amas de leite, mucamas, costureiras, etc. Na casa grande (casas da elite), as lavadeiras iam e vinham com seus turbantes e saias de bicos, penteados e estilos de vestir de suas terras de origem e de seu grupo étnico. Era uma forma de afirmação de suas identidades, de resistirem às marcas da escravidão e pós-escravidão.
Os encontros periódicos entre as lavadeiras criavam e solidificavam laços de amizade e solidariedade, ajudando na construção de um universo social relativamente autônomo da mulher negra, que a fortalecia para o enfrentamento das adversidades e do forte preconceito a que eram submetidas. Muitas respondiam sozinhas pelo sustento dos filhos, realidade que atravessou séculos e que ainda se mantém.
Em uma dessas, somos transportados para uma pequena cidade, onde Dona Maria, uma senhora de idade avançada, preta é conhecida por ser a melhor lavadeira da região. Seu ofício consiste em lavar roupas para os moradores da cidade, utilizando a tradicional água de barrela.
A água de barrela é feita através de um processo simples, mas que exige paciência e experiência. Dona Maria começa enchendo um barril com água limpa e adicionando sabão em pedra ralado. Depois, ela deixa essa mistura descansar por alguns dias, permitindo que o sabão se dissolva e que a água adquira propriedades de limpeza.
Quando chega o dia de lavar as roupas, Dona Maria pega um pedaço de pano limpo e mergulha na água de barrela, fazendo movimentos circulares para ensaboar as peças. Ela tem mãos ágeis e experientes, capazes de retirar até mesmo as manchas mais difíceis.
Enquanto lava, Dona Maria vai contando histórias e cantarolando canções antigas que seus ancestrais ensinavam no tempo do cativeiro. Ela se lembra dos tempos em que as lavadeiras se reuniam à beira do rio, compartilhando risadas e conversas animadas enquanto trabalhavam. A água de barrela era o segredo para roupas limpas e bem cuidadas.
A importância da água de barrela na vida das pessoas daquela cidade. Representa a tradição, a simplicidade e o cuidado com as coisas do dia a dia. Era um tempo em que as tarefas domésticas eram realizadas com calma e dedicação, sem a pressa e a tecnologia dos dias atuais.
Dona Maria termina de lavar as roupas e as coloca para secar ao sol. Ela observa com satisfação o resultado do seu trabalho e sente um orgulho genuíno por preservar essa tradição. A água de barrela continua a ser utilizada por ela e por outras lavadeiras, mantendo viva a memória de um tempo em que a simplicidade e o cuidado eram valorizados.
Assim, a água de barrela nos transporta para um passado nostálgico, repleto de memórias e tradições que merecem ser lembradas e valorizadas. É um convite para refletirmos sobre a importância de preservar as tradições e os ofícios que fazem parte da nossa cultura.
Denilson Costa
Emocionante!!!!