A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) deve tomar as medidas necessárias para inibir cancelamentos unilaterais e injustificados dos planos de saúde de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA). Foi o que recomendou o Ministério Público Federal. No documento, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) e a Câmara de Consumidor e Ordem Econômica (3CCR), órgãos do MPF, alegam que a prática é discriminatória e viola direitos constitucionais e legais dessas pessoas aos serviços de saúde. A ANS tem 45 dias para informar as ações adotadas.
De acordo com o MPF, a conduta irregular e reiterada dos planos de saúde é resultado da omissão da ANS em regulamentar o tema. “Verifica-se que a agência não exerce a contento sua competência regulatória, gerando sérios transtornos”, reforça a recomendação. A Lei nº 9.961/2000, define que cabe à ANS regular de forma integral e efetiva o setor privado de planos e serviços de saúde.
Irregularidades
A avaliação é a de que as resoluções da ANS não têm sido suficientes para prevenir irregularidades e para controlar e apurar práticas discriminatórias. Por isso, requer a implementação de normas e ações efetivas que fiscalizem as atividades dos planos e seguros de saúde, assegurando a prestação de serviços adequados e ininterruptos.
As medidas sugeridas incluem, entre outras, a adequação dos sistemas de informação da ANS para identificação de práticas discriminatórias ilegais; a garantia de acesso a todas as informações relevantes para verificação da adequação do contrato e dos serviços prestados às necessidades dos beneficiários, além do acompanhamento, por parte da agência reguladora, dos serviços ofertados para tratamentos multidisciplinares.
O MPF pede ainda que a ANS tome medidas para impedir o descredenciamento imotivado das clínicas credenciadas ou que as empresas determinem o tipo e número máximo de sessões de tratamento aos usuários com necessidades de atendimento multidisciplinar.
“As denúncias e inúmeras reclamações por parte de usuários e o exponencial crescimento da judicialização de casos envolvendo cancelamentos unilaterais de planos de saúde de pessoas com deficiência denota a prática discriminatória de que se valem as empresas para reduzir os custos de suas operações”, destaca trecho da recomendação. Nesse sentido, o MPF ressalta que “os maiores prejudicados pelas práticas abusivas são consumidores que, por suas próprias condições de saúde, já se encontram em evidente situação de fragilidade”, incluindo nesse grupo as pessoas com TEA.
Investigação
A recomendação é resultado de procedimento administrativo aberto pela PFDC, em junho de 2024, para fiscalizar irregularidades. Durante a investigação, o órgão requisitou informações à ANS e realizou reuniões com diversos órgãos e entidades, como o Conselho Nacional de Saúde, a Defensoria Pública da União, a Associação de Amigos do Autista e o Instituto de Defesa dos Consumidores, além de representante da sociedade civil.
Em resposta ao MPF, a agência reguladora ANS informou ter recebido mais de 36 mil demandas referentes a negativa de atendimento para beneficiários com TEA entre 2022 e 2024. Já a Agência Brasil apurou que, entre abril de 2023 e janeiro de 2024, foram registradas mais de 5,4 mil reclamações de cancelamentos unilaterais de planos de saúde no portal do consumidor, ligado à Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon).
Conforme a Política Nacional de Proteção dos Direitos das Pessoas com Transtorno do Espectro Autista (Lei federal 12.764/2012), a pessoa com TEA não pode ser impedida de participar de planos privados de assistência à saúde em razão de sua condição de pessoa com deficiência. No mesmo sentido, a Lei federal 9.656/1998 garante que ninguém pode ser impedido de participar de planos privados de assistência à saúde em razão da idade do consumidor ou da condição de pessoa com deficiência.
Outra norma federal, a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015) estabelece que as operadoras de planos e seguros privados de saúde são obrigadas a garantir à pessoa com deficiência, no mínimo, todos os serviços e produtos oferecidos aos demais clientes. A norma ainda define como crime, punível com reclusão de 2 a 5 anos e multa, o ato de recusar, retardar ou dificultar internação ou deixar de prestar assistência médico-hospitalar e ambulatorial à pessoa com deficiência.
Com informações de assessoria
Wagner Sales – Editor de conteúdo