Indígena da comunidade Tekohá Dje’y da comunidade Guarani Mbyá e Nhandeva no Rio Pequeno, município de Paraty (RJ), denunciou as amaeaças. Foto: Divulgação.

Ativistas dos direitos humanos debatem futuro do programa no Rio

Rio (RJ) – “Morte”. “Bala”. “Limbo”. Três mulheres negras usaram essas palavras para expressar o sentimento de lutar pelos direitos humanos no Rio de Janeiro. O medo poderia paralisá-las, mas elas resolveram lutar. Neusa, Iosana e Renata não se calaram e contaram suas lutas, durante participação em audiência pública sobre o futuro do Programa de Proteção de Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas (PEPDDH/RJ), realizada na última sexta-feira (26/7), no auditório da Procuradoria da República no Rio de Janeiro (PR/RJ).

A audiência foi convocada pelo Ministério Público Federal (MPF) e pela Defensoria Pública da União (DPU) para debater o futuro do programa no Rio de Janeiro, após a não renovação do convênio entre a União e o estado, no fim do ano passado e após o término, em abril deste ano, do contrato com a entidade executora. O Programa é o maior do país e conta, atualmente, com 80 casos assistidos.

Edital

Durante a audiência pública, o representante da esfera federal, o secretário nacional de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos (SNDH/MDHC), Bruno Renato Teixeira, anunciou, para a primeira quinzena de agosto, a publicação do edital para a contratação de nova entidade executora para o PEPDDH/RJ. Ele também explicou que, para não deixar de assistir os defensores no Rio após o fim do contrato, no começo do ano, a entidade executora nacional assumiu provisoriamente a gestão no estado.

De acordo com informações do MDHC, a gestão do programa no Rio de Janeiro passa a ser nacional e o edital trará a ampliação do PEPDDH/RJ, com aumento de orçamento para R$ 9 milhões em 36 meses de execução de contrato. O documento também estabelece um acréscimo de pessoal, passando para 35 profissionais divididos em três equipes de atendimento: uma para a capital, outra para a Baixada Fluminense/Niterói e a última para atender o interior fluminense.

O MDHC também informou que pretende reforçar o método de acolhimento e retirada emergencial dos atendidos, com a contratação de um gestor de análise de risco permanente, com a perspectiva de ampliação do número de acolhimentos provisórios.

O edital será na modalidade chamamento público, em vez de carta-convite, opção anterior escolhida pelo governo estadual. Pelo cronograma apresentado pelo secretário nacional, até o fim do mês de setembro estaria concluída a contratação de nova entidade executora do programa.

Durante a audiência pública, a liderança indígena Neusa Kunhã Takuá destacou os desafios que os defensores dos direitos humanos enfrentam. “Nós defendemos o meio ambiente, a vida no planeta, e temos pagado, por isso, com a nossa própria vida”, destacou, ao contar a história do assassinato de seu irmão, o então vice-cacique Tekohá Dje’y João Mendonça Martins, em 2018, durante conflito com posseiros.

O Tekohá Dje’y é uma comunidade indígena Guarani Mbyá e Nhandeva no Rio Pequeno, município de Paraty (RJ), composta por 43 pessoas e que ocupa parte de uma área de 2370 hectares, reconhecida pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), em 2017. Desde então, a aldeia vem sendo alvo de inúmeros ataques. Essa região constantemente sofre com invasões de terras indígenas, desmatamento e caça ilegal.

Com a morte do irmão, a aldeia conduziu Neusa para a liderança dos Tekohá Dje’y, assumindo a incumbência de vice-cacique. Desde então, as ameaças de morte se tornaram parte de sua vida como ativista. Em 2020, a aldeia foi alvo de novos ataques, quando os indígenas tiveram que pedir abrigo em territórios vizinhos. Devido aos ataques, Neusa foi inserida no programa de proteção aos defensores dos direitos humanos do estado do Rio de Janeiro.

“O Rio de Janeiro é terra indígena!”, começou a discursar Neusa, durante a audiência pública, e continuou: “Eu sou uma das que se diz estar no programa como defensora de direitos humanos. Assumi há cinco anos como vice-cacique, logo depois que meu irmão foi assassinado. Fui atendida pelo programa em 2021, quando sofri tentativa de homicídio dentro no meu município, em Paraty. Desde então, sou vítima de perseguição política e várias tentativas de homicídios”, compartilhou.

A angústia da indígena Neusa é também compartilhada por Iosana Domingues, liderança no Quilombo Justina/Izabel, no município de Mangaratiba (RJ). “Nós que estamos dentro dos territórios sabemos como é difícil viver com ameaças. As comunidades indígenas, quilombolas e caiçaras são ameaçadas diariamente. Desde 2022, nunca mais recebemos visitas do programa. Nunca mais fomos assistidos. Enquanto não é resolvido, as vidas estão à mercê da bala, ceifadas, sem proteção”, desabafou.

Limbo – O “limbo” foi a metáfora usada pela deputada estadual (PSOL-RJ) Renata Souza para falar da sensação de falta de proteção aos defensores e defensoras que atuam no Rio de Janeiro, tendo em vista a indefinição da política pública. “Meu anseio é que defensores e defensoras de direitos humanos como eu atuem de maneira mais segura. O Estado Brasileiro está descumprindo sua obrigação internacional de assegurar as vidas dos defensores de direitos humanos”, alertou.

Com presença de indígenas, caiçaras, quilombolas, movimentos sociais e parlamentares, a audiência pública também teve participação de representantes das esferas federal e estadual.

 

Com informações de assessoria / MPF

Wagner Sales – Editor de conteúdo

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