Por: Jorge Eduardo Magalhães
Um grande empreendimento num bairro nobre da cidade seria inaugurado e a empresa resolveu fazer um coquetel para o evento.
Fui incumbido pelo doutor Otávio para organizar os comes e bebes da recepção, o que me deixou muito orgulhoso. Era uma honra ser o homem de confiança do todo- poderoso da Torres Leal. Sentia-me como seu legítimo homem de confiança, o seu braço direito.
Cheguei cedo ao local para conferir se estavam em ordem todos os preparativos para a festa. Sob minha supervisão, o coquetel teria tudo do bom e do melhor. O doutor Otávio ficaria eternamente grato pela recepção organizada por mim, seria impecável. Pressentia que, naquela noite, ele perceberia o meu enorme valor como profissional.
Os empregados do bufê e da limpeza não me respeitavam e nem obedeciam às minhas ordens, embora eu tentasse explicar, em vão, que eu era o responsável por coordenar a organização daquele evento. O pessoal da limpeza se recusou a limpar o salão, e fui obrigado a fazer tudo sozinho, mas não tinha problema, eles iam ver só: depois do evento, eu contaria tudo ao doutor Otávio, ou então, para meu grande amigo Ricardo.
Conferi todos os detalhes e verifiquei que estava tudo em ordem. Faltava pouco para o evento começar.
A recepção começou. O doutor Otávio chegou acompanhado de sua esposa, Ricardo e Bianca. Foi uma entrada triunfal daquela linda família. Estes dois últimos me deram um sorriso cordial. Coitados, tão atribulados! Não podiam, naquele momento, abraçar-me como um verdadeiro amigo, pois estavam num evento empresarial e tinham que manter o respeito na frente dos subalternos e investidores.
Bianca estava ainda mais deslumbrante. Cada vez mais linda!
Tentei falar com o doutor Otávio a respeito da insubordinação do pessoal do bufê e o fato de eu ter ficado sobrecarregado. Grosseiramente, ele falou que não queria que desse nada errado, caso contrário, eu estaria no olho da rua. Fiquei sem jeito, porque alguns convidados perceberam a forma ríspida com que ele falou comigo. Não levei a mal, afinal, compreendia que ele estava tenso com aquela recepção. Olhei para o Ricardo para ver se ele falaria algo em minha defesa, mas continuou conversando com os convidados. Acho que estava distraído.
O meu ex-colega chegou acompanhado de uma bela mulher. Não sabia ao certo se era sua namorada ou sua noiva. Ele, como sempre, olhou-me com desdém. Como eu o odiava. Ricardo e Bianca os abraçaram com muito afeto. Fingi que estava fazendo algo para ouvir o que eles falavam. Muito empolgado, Ricardo lhe contou que Bianca estava grávida. Nossa! Como fiquei emocionado. Tive vontade de abraçá-los, de lhes dar os parabéns, mas me contive, afinal de contas, ele era o filho do dono da empresa e não podia se expor com um funcionário, mesmo sendo seu grande amigo. Tinha certeza de que ele me chamaria para ser padrinho. Mas, ouvi-o convidar o ex-colega e sua companheira para serem os futuros padrinhos da criança. Naquele mesmo instante, o doutor Otávio se aproximou de mim e perguntou o que eu estava fazendo ali no meio dos convidados. Pedi desculpas e retornei ao serviço, fiquei muito sobrecarregado, já que o pessoal do bufê jogava tudo nas minhas costas. Desempenhava o papel de garçom, copeiro, lavador de pratos, faxineiro, entre outros. Sentia-me muito cansado, mas não me importava: sabia que o meu valor seria reconhecido. Os japoneses pareciam muito satisfeitos com a recepção. Olhavam tudo ao redor. Fiquei orgulhoso, afinal, eu era o responsável para o sucesso do evento. Alguma coisa me dizia que aquele seria o meu dia de glória.
A festa estava muito linda. Som ambiente, bufê da mais alta qualidade e todos em traje de gala. Um dia chegaria a minha vez. Eu estaria ao lado do meu amigo Ricardo, seria o seu braço direito. Fiquei imaginando o dia em que eu estivesse ao seu lado com um alto cargo na Torres Leal. Sentia que este dia estava chegando, seria em breve.
Não fiquei chateado pelo fato de o Ricardo não me convidar para ser padrinho de seu filho, sabia que no mundo dos negócios existem muitos jogos de interesses. Quem sabe o próximo filho?
De repente, a esposa do doutor Otávio começou a berrar desesperada, dizendo que fora ao toalete retocar a maquiagem, havia tirado o brilhante do dedo para lavar as mãos e esquecera a joia em cima da pia e, mal se deu conta do esquecimento, voltou e não a encontrou mais. Nossa! Que escândalo. Foi um silêncio geral na festa. O doutor Otávio me chamou. Certamente, pediria ajuda para encontrar a joia. Aproximei-me e, olhando bem nos meus olhos, exigiu que eu lhe entregasse a joia. Não sabia o que fazer com tanta vergonha. Eu disse que não sabia onde ela estava, que eu não havia pegado. Aos berros, ele disse que sabia que tinha sido eu, pois somente eu havia circulado no meio dos convidados. Desesperado, tentava me defender, jurava que era inocente. O doutor Otávio ameaçava chamar a polícia e meu ex-colega, com ar de satisfação, incentivava-o a me punir. Os japoneses pareciam não entender o que estava acontecendo. Em vão, tentava provar a minha inocência. Ricardo e Bianca nada falavam; apenas me olhavam espantados. Acalmando a sua voz, o doutor Otávio prometeu que se eu entregasse o anel me perdoaria, esqueceria o fato e não chamaria a polícia.
De repente, aconteceu o inesperado: a companheira do meu ex-colega, não aguentando mais ver aquela injustiça, acusou seu companheiro de ter furtado a joia e ainda disse que ele tinha mania de fazer isso em todas as festas. Ela exigiu que meu ex-colega entregasse o anel de brilhante para sua dona e, com os olhos arregalados, ele o tirou do bolso e entregou-o à esposa do doutor Otávio. Foi um silêncio geral. Respirei aliviado. Finalmente eu estava de alma lavada. Aquele pilantra, humilhado, seria posto no olho da rua, e eu seria o braço direito do Ricardo e, com certeza, eu seria padrinho de seu filho. Claro que ele não sairia sem antes ser obrigado a me pedir desculpas.
Mas, ao contrário do que eu imaginava, o doutor Otávio estufou o peito e deu uma enorme gargalhada. Todos riram também. Com satisfação, o doutor Otávio deu um tapinha nas costas de meu ex-colega e o chamou de irreverente e gozador. Que susto você nos deu, sempre nos pregando peças. A própria companheira de meu ex-colega ficou espantada com a atitude do doutor Otávio, que encarava o ladrão como um irreverente e extravagante. Até a esposa do Dr. Otávio, Ricardo e Bianca também riam. Todos os convidados acharam aquilo divertido.
Fiquei por alguns instantes estático diante daquela cena. Eu sabia que Ricardo e Bianca, no fundo, estavam constrangidos com aquela cena, e riam apenas para não contrariarem o patriarca da família.
Só despertei do meu movimento estático quando doutor Otávio me perguntou o que eu estava fazendo ali. Tentei murmurar algo, mas, grosseiramente, mandou que eu voltasse ao meu posto. Meu ex-colega, mais uma vez, olhava-me triunfante e com ar de desprezo.
De cabeça baixa fiz o ordenado. Percebi pelo canto dos olhos Ricardo e Bianca me olhando penalizados. Percebi que eles ficaram indignados com a situação e, assim que tivessem oportunidade, conversariam com o doutor Otávio.
A festa continuou normalmente.
NÃO PERCAM O CAPÍTULO DE AMANHÃ.
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