CONFISSÕES DE UM ADULADOR: Capítulo 14

Por: Jorge Eduardo Magalhães

Não parava de pensar na morte do meu algoz. Estava com essa ideia fixa na cabeça. Assim que tivesse oportunidade daria fim naquele crápula. Ao anoitecer, passaria na casa de minha amada, diria que estava disposto a fazer o que ela queria e pegaria de volta o frasco com o veneno. Imaginava o glorioso dia em que o doutor Otávio, com sua arrogância de sempre, me pediria para servir seu café. Colocaria as gotas do frasco em sua xícara. Como seria delicioso, para meu deleite, vê-lo degustando o líquido da morte e, alguns minutos depois, agonizando. Para não levantar suspeitas, gritaria desesperado pedindo um médico, uma ambulância. Antes de qualquer tipo de socorro, o crápula morre, minha amada recebe o dinheiro do seguro e vivemos felizes no meu apartamento.

Pensei sobre minha vida, sobre meu passado, pensei em Ricardo. Ele nunca fora meu amigo, nunca gostou de mim, não me considerava igual a ele. Não era diferente do meu ex-colega, apenas fingia-se de bom moço. Todas as vezes que me defendeu no colégio foi para aparecer, impressionar as pessoas, no fundo sentia desprezo por mim como todos os outros.

Naquele dia, me dei conta de que, no fundo, odiava Ricardo, nunca gostei dele, na verdade, sentia inveja, queria estar no seu lugar, queria ter Bianca para mim nua na minha alcova, queria ser o próprio Ricardo. Odiava-o por ele existir, por eu não ser ele. Eu sempre fora o seu oposto, um fracassado. Queria ter o seu sucesso, a sua inteligência, o seu charme, o seu carisma e, principalmente, a sua fortuna. Se pudesse, mataria pai e filho, mas como não era possível, só o doutor Otávio já estava de bom tamanho.

Ao anoitecer, tomei meu banho naquele imundo banheiro coletivo da hospedagem onde vivia, e me arrumei para ir à casa de minha amada.

Estava ansioso para estar com ela e lhe dizer que tinha mudado de ideia, que iria assassinar o seu algoz. Certamente ficaria emocionada e me daria um abraço bem gostoso. Quem sabe aquela não seria a nossa primeira noite?. A primeira de várias pelo resto de nossas vidas.Cada segundo que eu demorava a chegar era um martírio.

Quando cheguei, não tinha ninguém na portaria do prédio. Aquele porteiro era muito relapso. Um condomínio tão caro com um serviço de péssima qualidade que era insuficiente. Sem falar com ninguém, fui entrando.

O elevador demorou uma eternidade para chegar e para subir até o andar de minha amada. Cheguei até sua porta. Toquei a campainha, ninguém abriu. Mexi na maçaneta, a porta estava encostada. Ela estava em seu quarto, a porta estava fechada e o ar-condicionado ligado. Por isso não tinha escutado a campainha.

Não acreditei no que vi quando abri a porta de seu quarto. Ela estava na cama nua com meu ex-colega. Estavam tão entretidos que nem perceberam a minha presença. Fiquei estático, meu coração estava dilacerado. Finalmente perceberam que eu estava ali e, antes que esboçassem qualquer reação, saí correndo feito um louco. Queria morrer, era muita humilhação, nada para mim faria sentido.

Pensei em dar fim à minha vida, acabar logo com anos e anos de martírio, humilhações e sofrimentos. Cheguei a parar em uma ponte alta e tive o impulso de me jogar, mas mudei de ideia. Nada mais para mim era importante, mas pelo menos adiei tal decisão, ainda não era hora de morrer, tinha algo muito importante para fazer: desmascarar o meu ex-colega e seu cúmplice para o doutor Otávio. Aqueles dois mereciam pagar tudo o que fizeram comigo. O doutor Otávio me ouviria, demitiria aquele pilantra e ela voltaria para sua vida miserável.

Pensei em ir correndo à casa do doutor Otávio, mas seria melhor falar com ele no dia seguinte na sua sala.

Parei no bar e pedi uma cerveja. Depois outra e outra.

Acordei cedo com certa dificuldade, não estava acostumado a beber. Logo que cheguei à empresa, a secretária disse que o doutor Otávio queria falar comigo em sua sala. Ótimo, o dia estava favorável para mim. Levei um susto quando entrei em sua sala e me deparei com o doutor Otávio ao lado de sua amante e de meu ex-colega. Antes que eu abrisse a boca, o doutor Otávio disse de forma severa que já sabia de tudo e que não esperava aquilo de mim. Não entendi o que ele queria dizer e, aos berros, perguntou como é que eu poderia ter coragem de assediar sua amante. Tentei dizer em vão que aquilo não era verdade, mas ele me mandou calar a boca. Meu ex-colega, com a cara mais cínica do mundo, disse que ela não aguentava mais, mas tinha medo da reação do doutor Otávio e, por isso, pediu sua ajuda para se livrar de mim. O doutor Otávio nem me deixou falar, ordenou que eu me retirasse de sua empresa e fosse ao departamento de pessoal acertar minhas contas. “Ah!”, disse o doutor Otávio, “Para você não dizer que sou ruim, pode pegar com o síndico do seu prédio a chave de seu apartamento, você não vai ficar desempregado, o síndico tem um emprego para te arranjar”. Abaixei a cabeça e saí.

Recebi o que me deviam no departamento de pessoal e saí sob os risos e chacotas dos colegas.

Antes mesmo de pegar as poucas coisas que tinha no meu quarto de hospedagem, fui ao prédio falar com o síndico e pegar as chaves do meu novo apartamento. O síndico era um tipo gordo, de bochechas rosadas e com arrogância em seus gestos. Aproximei-me dele me apresentei, dizendo ser proprietário de um dos apartamentos do condomínio e que o doutor Otávio havia me recomendado. Ele deu um sorriso sarcástico e perguntou se eu preferia ver primeiro o emprego ou o apartamento. Como estava ansioso pedi para ver o apartamento. Ele deu outro sorriso e pediu para acompanhá-lo. Estava impaciente para ver minha nova morada.

Não acreditava no que vis: o meu novo apartamento não era nada mais, nada menos do que um depósito de materiais de limpeza próximo da administração. Antes que eu perguntasse sobre o emprego, o síndico me deu um balde e uma vassoura, disse para pegar o uniforme do condomínio e que já poderia começar o serviço.

NÃO PERCAM O ÚLTIMO CAPÍTULO.

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One comment

  1. Avatar

    Não. sei se dá pena ou raiva. Coitado!

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