Eleições e Autovalor

Em época de eleições, principalmente as municipais, vem como muita frequência em mim o sentimento de autovalor que deveríamos ter, mas que nos foi subtraído aos poucos aos longos dos anos.

Eu moro no Rio Grande do Sul. Passamos por uma das maiores catástrofes que o Estado já viu, expondo diante de nossos olhos muitas dores, sofrimentos, abandono, ausência de cuidados com o meio ambiente e com a vida humana.

Nesse ponto, tristemente preciso dizer que existem pessoas fora de suas casas, porque a gestão municipal não apresentou condições, ainda, de resolver a vida das famílias desabrigadas, que não podem chagar até sua casa ou que lhes restou apenas um terreno.

O abandono do ente público é altamente comum em todo país, sabemos disso, mas parece que o Rio Grande do Sul, tanto deixou de lado o bem estar da maioria, vindo, por exemplo, a construir em áreas que deveriam estar preservadas o que fez com que as pessoas, ao menos sob a minha visão, perder totalmente o sentimento de auto valor e de merecimento.

Mesmo depois das águas baixarem, não se ouve falar sobre políticas de fato eficazes em defesa do meio ambiente, dos fatores climáticos, um comitê capacitado e efetivo de planejamento e de evitação de novos desastres. Em sentido contrário, todo Brasil se mobilizava entregando donativos de toda as naturezas, todavia, a corrupção corria solta, muita gente enganada pelo próprio governo, que deveria garantir moradia e segurança, mas, ao revés, apenas ofertou migalhas e abrigo através, justamente, de donativos vindos de outros Estados e da iniciativa privada.

Explico porque volto a falar da enchente do Rio Grande do Sul: não ainda estamos abaixo de lama, a moral!

Ontem, pela manhã, minha equipe e eu fomos surpreendidos com ligações e mensagens de moradores da Colônia de Pescadores Z3, Lagoa dos Patos, Pelotas, em pânico em razão de que agentes da prefeitura estavam o local medindo forçadamente casas para verificar se teriam estruturalmente afetadas.

Enquanto faziam as “medições”, para os que ingressaram com ações indenizatórias, promovidas por nós, decorrentes da enchente, os mesmos agentes informavam que o governo não lhes bancaria móveis novos, que era só uma pesquisa de modo a ser verificado se a casa havia sido afetada na estrutura ou não.

Ou seja, flagrante retaliação do ente municipal para quem não concordou com sua política desidiosa e que causou prejuízos irreparáveis, como se a promessa de míseros móveis novos fossem reparar suas dignidades. Mas não foi só isso, fui surpreendida por uma estrada em péssimas condições, uma Colônia que parecia mais uma cidade fantasma do que uma Colônia de pescadores com centenas de comércios de pescados e de outros comércios em geral.

Durante o percurso, fiquei pensando onde estaria o sentimento de autovalor desse povo, que se apresentava com medo e não com indignação. A falta de percepção desse sentimento não o é, de forma alguma, culpa do próprio povo, na verdade, são vítimas de um sistema cruel e mordaz que não dá qualquer chance para o desenvolvimento pleno das pessoas em todos os setores.

Região escravocrata que é, nascida em berço de selvageria, mantém seus costumes com muito afinco, porém hoje a violência não distingue cor de pele, só é preciso exigir um pouquinho do que lhe é direito para o ataque vir a galope.

Pobre Pelotas, que não dá sequer estrada para os pescadores, que não trata água residual de enchente e que as pessoas não tem nem espaço para dar sua opinião na imprensa.

Que esta coluna chegue aqui no Rio, dê uma volta e, de alguma forma, retorne à origem, para que se leia: “pecadores, vocês merecem ser respeitados, suas casas não podem ser violadas e vocês tem valor, exijam respeito e não se amedrontem perante o sistema”.