Rafael Mortari*
Matérias de veículos especializados criticando o conservadorismo dos brasileiros no que diz respeito a investimentos são muito comuns. De forma geral, o brasileiro coloca suas economias na poupança ou em outro produto de renda fixa qualquer, como o CDB, o que de fato não é o mais recomendado. A poupança rende tão pouco que nem é considerada um investimento, e produtos como o CDB têm mais a função de proteção contra a inflação e reserva de segurança por conta de sua boa liquidez.
Acontece que, o alto número de especialistas recomendando a busca por alternativas mais rentáveis, como os produtos de renda variável, por exemplo, faz com que boa parcela das pessoas tome coragem para buscar informações com experientes corretores no intuito de fazer o dinheiro “crescer” mais rapidamente.
Quando saem em busca de um investimento melhor, querem algo com rendimento maior, porém, com a segurança das aplicações de renda fixa. É aí que mora o perigo. Nessa hora o experiente profissional que está do outro lado do balcão da corretora ouvindo os sinceros desejos do investidor aproveita para sugerir a aplicação do dinheiro em COE (Certificado de Operações Estruturadas). O inexperiente investidor não sabe, mas acabou de cair em uma armadilha.
O COE é composto por diversos tipos de ativos. Até os especialistas mais experientes têm dificuldades para explicar o que tem ali dentro e qual a lógica de tal estruturação. Em um primeiro momento fica a impressão de que, de ruim, apenas o fato de o dinheiro só poder ser sacado na data estipulada no contrato, caso contrário as taxas pagas são tão altas que geram perdas. Mas, para compensar, o corretor projeta “a possibilidade” de um rendimento muito bom, bem acima do CDI. Ele deixa claro que se trata de um produto de renda variável, mas com uma característica que se encaixa perfeitamente nas necessidades do cliente. Na pior das hipóteses, se o COE não render absolutamente nada, pelo menos o investidor poderá sacar o dinheiro aplicado sem perda alguma.
Parece o produto perfeito. Mas não é. Há duas razões para o investidor dizer não e evitar cair em uma grande armadilha, que na melhor das hipóteses renderá pouco ou nada, mas que pode até mesmo levá-lo à falência. Vou começar explicando a primeira situação, a de ganhar pouco ou nada. Uma pesquisa feita pela FGV (Fundação Getúlio Vargas) com 284 COEs emitidos entre 2016 e 2019 mostra que apenas 32 deles tiveram retorno maior do que o oferecido pelo título do Tesouro Nacional Prefixado disponível no momento da emissão do COE. Considerando os 32, em nenhum deles a relação risco-retorno foi melhor do que a observada para o índice Ibovespa.
Você, caro leitor, pode até considerar que a pesquisa da FGV é antiga e que as coisas mudaram. Mas não. Um levantamento feito neste ano de 2024 por um grande jornal especializado em finanças e divulgado no início de abril mostra que os resultados dos COEs estão ainda mais tímidos, além de continuarem sofrendo com a falta de transparência. Esta nova pesquisa incluiu 3.310 COEs lançados entre 2019 e 2023. Entre os emitidos em 2019, 70% bateram o CDI. Já os lançados em 2020 o percentual ficou em 29%. Em 2021 foi de 13% e em 2022, pífios 4%.
A pesquisa não fala, mas entre os que não bateram o CDI estão os que renderam menos e os que não renderam absolutamente nada. Mas pode ser pior. E agora vou falar justamente do segundo caso, que é o de perder tudo. Em pouco mais de um ano, um investidor, hoje cliente do meu escritório, perdeu cerca de R$ 3 milhões, valor este que reúne a economia de toda sua vida. Conservador, seu objetivo ao buscar um assessor de investimentos era o de investir seu patrimônio de forma a obter uma renda passiva mensal e a tão sonhada liberdade financeira.
O sonho, no entanto, foi por água abaixo. Além de ser orientado a colocar seus recursos em um COE, ele ainda realizou um empréstimo – induzido pelo assessor – para ampliar o aporte nesta modalidade de investimento, com a promessa de que os encargos financeiros só seriam cobrados três anos depois, quando o investimento fosse liquidado. Para sua surpresa, após 12 meses, ele se viu com a dívida dos juros do financiamento e, sem dinheiro para arcar, teve seu COE liquidado com prejuízo, já que foi sacado compulsoriamente para quitar a dívida gerada artificialmente. Hoje ele se encontra dependente da ajuda de familiares para se manter.
Este é apenas mais um caso entre tantos que surgiram após a denúncia de vários investidores prejudicados por assessores de investimentos mal-intencionados. Isso mesmo, se não bastasse o produto em si ser ruim como atestam pesquisas sérias, há o risco de o investidor ser enganado por aqueles cuja função é o de instruir. Isso acontece porque as instituições oferecem uma comissão alta para os assessores que vendem COEs. Para conseguir essa gorda comissão, normalmente maior do que a oferecida pela venda de outros produtos, alguns deles enganam clientes com falsas promessas, mentiras e omissão de informações.
A quantidade de investidores lesados está aumentando bastante. Sem contar aqueles que não foram prejudicados da pior forma, mas obtiveram um rendimento pífio, que conseguiriam aplicando o dinheiro em qualquer produto de renda fixa com maior liquidez, e aqueles que sacaram sem nenhum retorno. Não nos esqueçamos, ainda, daquele investidor que nem sabe que esta neste nefasto produto, ou daquele que olha para o Home Broker e enxerga uma enganosa informação de perfomance que ninguém sabe se irá ou não se confirmar. Diante desses fatos não existe outro conselho a dar que não seja: Fuja dos COEs e se livre de uma grande dor de cabeça.
*Rafael Mortari é sócio do escritório Mortari Bolico Advogados