Brasília (BSB) – O Governo Federal, em nome do Estado brasileiro, pediu publicamente desculpas à população negra pela escravização das pessoas negras e seus efeitos. O evento, nesta segunda-feira (21/11), reuniu a ministra dos Direitos Humanos e da Cidadania, Macaé Evaristo, a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco e o Advogado-Geral da União, Jorge Messias.
Durante o momento histórico do pedido de desculpas, a ministra Macaé Evaristo rememorou a luta da população negra por liberdade, igualdade e conquista de direitos. “Nessa caminhada de luta, que é abolicionista, que a gente lutou e continua lutando por liberdade, a gente vem construindo a cada dia passos muito importantes. Essa memória de mais de 300 anos de escravatura não acaba no 13 de maio, porque o 14 de maio começa com o total abandono da população negra no país”, lembrou.
“Toda essa construção foi sendo trabalhada com muita luta e com muita força pelos movimentos negros ao longo do século XX e no início do século XXI, assim como o dia de hoje também é resultado dessa luta e de ações efetivas de muitos atores do movimento negro que fazem com que o Estado brasileiro vá mudando e se reconstruindo porque, infelizmente, ainda hoje, a gente tem um Estado impregnado pelo patrimonialismo, pelo racismo e pelo colonialismo”, finalizou a ministra.
Marielle Franco
A ministra Anielle Franco, da Igualdade Racial, fez referência à memória de sua irmã, a vereadora Marielle Franco, assassinada em 2018. “Para além do pedido de desculpas, no ano de 2024, nós tivemos a condenação dos assassinos de minha irmã. Não é normal a cada dia e em cada instante a gente ter que lidar com essas mazelas e essas dores. São desafios enormes e, por isso, é importante a gente pensar esse trabalho coletivo, um trabalho coletivo concreto”, disse.
Já o advogado-geral da União, Jorge Messias proferiu a leitura do pedido de desculpas oficial em nome do Estado brasileiro à população negra. “A União manifesta publicamente o pedido de desculpas pela escravização das pessoas negras, bem como de seus efeitos. Reconhece que é necessário envidar esforços para combater a discriminação racial e promover a emancipação das pessoas negras brasileiras. Por fim, compromete-se a potencializar o foco de criação de políticas públicas com essa finalidade”, leu Messias.
O evento marcou também o lançamento da Plataforma JurisRacial, um repositório jurídico digital destinado a compilar e a disponibilizar documentos jurídicos sobre a temática racial. A plataforma tem como objetivo dar visibilidade e trazer informações para apoiar a superação do racismo e suas múltiplas formas.
Registros de injúria
Ao mesmo tempo, casa da vítima, instituições de ensino, ambiente virtual. Os locais são diversos e constam entre os cenários onde houve registros de injúria racial e racismo em 2024, conforme dados divulgados pelo Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC) nessa quarta-feira, 20 de novembro, data em que é celebrado o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra. Gratuito e anônimo, o Disque 100 recebeu mais de 3,4 mil denúncias que abrangem mais de 5,2 mil violações de cunho racial entre janeiro e o início de novembro de 2024.
A legislação brasileira qualifica o racismo como crime inafiançável e imprescritível, conforme o Artigo 5º, inciso XLII, da Constituição Federal de 1988. A Lei nº 14.532, de 2023, atualmente tipifica a injúria racial também como crime de racismo, com pena de dois a cinco anos de reclusão e multa. De modo geral, o racismo é definido como um crime contra a coletividade, enquanto a injúria é direcionada ao indivíduo.
Ouvidora nacional dos Direitos Humanos, Denise de Paulo explica o fluxo do canal de denúncias. “A Ouvidoria tem o papel de receber, examinar e encaminhar denúncias de crime de racismo. É necessário que o cidadão se sinta seguro e confortável para efetivar a denúncia, que é encaminhada às autoridades competentes, como a polícia ou órgãos de defesa dos direitos humanos. Isso ajudará a garantir que a conduta discriminatória seja registrada e investigada. Por outro lado, há necessidade de analisar indicadores para avançar na construção de políticas públicas de enfrentamento ao racismo”, afirma a gestora.
Outros espaços também constam como cenários de violações raciais, entre eles, o local de trabalho da vítima, vias públicas, estabelecimentos comerciais, unidades de saúde, órgãos públicos, serviços de abrigamento, delegacias e transporte público. Já a relação “suspeito x vítima” envolveu vizinhos, desconhecidos, empregadores, funcionários, colegas de trabalho, prestadores de serviço, familiares, alunos, professores, diretores de escolas e de outras instituições, e ex-companheiros, entre outros vínculos.
Nesta gestão, o serviço está sendo mais divulgado e acionado pela população. Em 2023, o Disque 100 registrou 3,1 mil denúncias de racismo e injúria racial e 4,6 mil violações. Já em 2022, o serviço foi menos acionado, com 1,8 mil denúncias e 2,3 mil violações, seguidas por 1,4 mil denúncias e 1,4 mil violações em 2021. Ressalta-se que em uma única denúncia pode conter uma ou mais violações.
Outra iniciativa do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), o Observatório Nacional dos Direitos Humanos (ObservaDH) fez um levantamento com dados que apontam como o racismo amplifica as desigualdades sociais, além de submeter pessoas negras a um contexto de maior vulnerabilidade e negação de direitos.
Um exemplo disso é que as pessoas pretas e pardas são as que mais possuem o direito à infância e à adolescência digna violado. Em 2022, 67% das crianças e 85% dos adolescentes assassinados no Brasil eram negros e negras. As pessoas desse grupo étnico também são a maior parte entre indivíduos em situação de rua no país. Ainda segundo o ObservaDH, em 2023, elas eram 68% das pessoas que vivem nas ruas.
Segmentos sociais
Também é dificultado o direito das pessoas negras a envelhecer com dignidade. De acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2022, no quesito raça/cor, mais da metade das pessoas idosas são brancas (50,6%), assim como a população branca atinge idades mais avançadas do que a população negra no Brasil. Ainda entre as pessoas idosas, a taxa de analfabetismo entre pessoas idosas negras (23,3%) é mais que o dobro da taxa entre pessoas idosas brancas (9,3%).
Já no campo das pessoas com deficiência, as desigualdades raciais e de deficiência se cruzam no mercado de trabalho. As pessoas negras com deficiência recebem cerca de 36% a menos que pessoas brancas com deficiência e 44% menos que pessoas brancas sem deficiência. Ademais, pessoas negras com ou sem deficiência têm a maior taxa de informalidade comparadas às pessoas brancas também com ou sem deficiência, sendo a diferença maior entre as pessoas negras com deficiência em relação às pessoas brancas sem deficiência.
DISQUE 100 — Além de ligação gratuita, o Disque Direitos Humanos recebe denúncias de violações de direitos humanos por meio do WhatsApp (61) 99611-0100; Telegram (digitar “direitoshumanosbrasil” na busca do aplicativo); página da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos, no site do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania. Em todas as plataformas, as denúncias são gratuitas, anônimas e recebem um número de protocolo para que a pessoa denunciante possa acompanhar o andamento da denúncia diretamente com o Disque 100.
Sancionada pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, a Lei nº 14.759, de 2023, declara feriado nacional o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra, em 20 de novembro.
Com informações da agência gov.
Wagner Sales – Editor de conteúdo
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