Em meio às páginas da história do Brasil, dois cenários se destacam como símbolos de resistência, luta e liberdade: a senzala e o quilombo. Enquanto a senzala representava o espaço de opressão, exploração e dor dos escravizados, o quilombo emergia como um refúgio de autonomia, solidariedade e esperança para aqueles que buscavam escapar da tirania e da injustiça.
A senzala, com suas paredes de barro e palha, seus grilhões e correntes, era o símbolo da escravidão, da submissão e da brutalidade que marcaram séculos de opressão e violência contra os negros trazidos à força para as terras brasileiras. Ali, nas condições mais desumanas e degradantes, homens, mulheres e crianças eram privados de sua liberdade, de sua dignidade e de sua identidade, subjugados ao jugo implacável dos senhores de engenho. A Senzala era uma pequena cabana colocada do lado de fora da casa do senhor, um barraco onde os escravos ficavam desde depois do pôr-do-sol até antes do nascer do sol, acorrentados às paredes e atrás de portas trancadas.
A Senzala era a casa deles; ali criavam seus filhos e envelheciam. Em segredo, eles praticavam sua língua, religião e cultura longe dos olhos dos brancos. A janela da Senzala estava sempre voltada para o quadrante principal da plantação, onde um único poste podia ser visto emergindo da barriga da terra.
O Pelourinho, o mastro em que os escravos rebeldes eram torturados até a submissão ou morte, o que ocorresse primeiro. Esta era a Senzala!
De vez em quando, um grupo laborioso e dedicado de escravos se desertaria da generosidade dos chicotes e correntes do senhor dos escravos e das senzalas, e iria para a selva. Corriam, dia após dia, noite após noite, para a mata, mais profundamente para a floresta; longe dos traiçoeiros Capitães do Mato, os supervisores negros ou mulatos responsáveis pela captura dos escravos fugitivos. Na selva, eles procuravam esperança. Na selva, eles buscavam a liberdade. Na selva, longe do homem branco, procuraram o Quilombo.
Os quilombos eram cidades-estados criadas no coração da mata por escravos fugitivos. O mais famoso, o maior e aquele cujo nome foi sussurrado em segredo no escuro por aqueles em busca de liberdade, era Palmares que tinha uma população estimada de vinte a trinta mil habitantes, estruturada em onze aldeias diferentes. Em Palmares, como em outros Quilombos, os escravos fugitivos eram a maioria. Nativos e brancos pobres também eram aceitos no Quilombo, e partilhavam os mesmos direitos e deveres de qualquer outra pessoa. As decisões eram tomadas por assembleias de aldeias, nas quais cada adulto, homem ou mulher, de cada raça, poderia participar (e a maioria participava).
Palmares não era uma utopia. Não era uma sociedade comunista em que as decisões fossem tão horizontais quanto possível e em que todos fossem vistos como iguais. Palmares tinha chefes, um para cada aldeia. O chefe da capital, Macacos, era o rei de Palmares. Mas isso não é aqui nem agora.
Palmares morreu em chamas. Lutou até a última pessoa estar morta. Lutou por sua soberania e independência por mais de cem anos. Deu seu sangue para defender o que mais estimava, sua liberdade e sua autodeterminação.
Viviam pela sua liberdade e pela sua autonomia coletiva. Pelo seu direito de autodeterminação, para acabar com as correntes que os mantinham escravos no passado e para decidir por si mesmos o caminho de sua vida. Se morreram lutando por isso, morreram por aquilo pelo qual estavam vivendo. Morreram pela morte de pessoas livres.
A luta entre senzala e quilombo não se resumia apenas a uma questão física, era também uma batalha de ideias, de valores e de princípios que moldaram a história e a identidade do povo brasileiro.
Enquanto a senzala simbolizava a opressão e a desumanização, o quilombo representava a resistência e a busca pela igualdade, pela justiça e pela liberdade.
Hoje, olhando para o passado, é fundamental reconhecer o legado da senzala e do quilombo em nossa sociedade, é preciso lembrar as dores e as cicatrizes da escravidão, mas também celebrar a força, a coragem e a resiliência daqueles que lutaram por um mundo mais justo e igualitário. É na memória desses lugares, dessas histórias e desses símbolos que encontramos a inspiração para construir um futuro onde a liberdade, a dignidade e a solidariedade sejam os pilares de uma sociedade verdadeiramente inclusiva e democrática.
Que a senzala e o quilombo sejam sempre lembrados como marcos de uma história de luta e de superação, como faróis que iluminam o caminho para um Brasil mais justo, mais humano e mais igualitário para todos os seus cidadãos. Que a memória desses lugares nos inspire a construir um futuro onde a diversidade seja celebrada, a justiça seja garantida e a liberdade seja um direito inalienável para todos os que habitam essa terra de tantas histórias e de tantos sonhos.
Denílson Costa