Brasília (DF) – O Ministério Público do Trabalho (MPT) conseguiu reverter decisão de primeira instância que determinava o envio à Justiça Federal do processo judicial movido contra a União e a Anvisa, em que o MPT pede que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) cancele o registro de atrazina, ingrediente ativo presente em 5% dos agrotóxicos comercializados no país.
O desembargador relator do caso, Brasilino Santos Ramos, concordou com a argumentação do órgão e destacou que “a proteção do meio ambiente do trabalho é de importância não apenas entre as partes diretamente interessadas – empregado e empregador – mas diz respeito a toda a sociedade”.
Redução dos riscos
O entendimento, com ajustes que assinalaram o destaque constitucional conferido à redução dos riscos inerentes ao trabalho e à competência da Justiça especializada para apreciar atos que afetem a saúde, higiene e segurança dos trabalhadores, foi acompanhado pelas Desembargadores Pedro Luís Vicentin Foltran, Maria Regina Machado Guimarães e Augusto César Alves de Souza Barreto.
Contrariamente à competência da Justiça do Trabalho, de forma isolada, votou a Desembargadora Cilene Ferreira Amaro Santos.
A 7ª Vara do Trabalho de Brasília havia considerado que, apesar de o MPT apresentar, de maneira robusta, informações, dados, gráficos, resultados, testes e estudos que demonstram os graves danos dos agrotóxicos ao meio ambiente do trabalho e à saúde do trabalhador, o caso não decorria apenas de uma relação de trabalho e, por essa razão, deveria ser apreciado pela justiça comum.
O MPT recorreu da decisão e reforçou que o tema atinge direta, e primeiramente, a vida do trabalhador e o seu meio ambiente de trabalho, sendo condições suficientes para se firmar a competência material para apreciação e julgamento dos pedidos pela Justiça do Trabalho.
A Terceira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região declarou a competência da Justiça do Trabalho e devolveu os autos à primeira instância, para análise do mérito.
Registro
O Ministério Público do Trabalho (MPT) foi à Justiça Trabalhista, em outubro de 2023, para cobrar o cancelamento do registro da atrazina pela Anvisa. O ingrediente está presente em 5% dos agrotóxicos comercializados no país. A atrazina é um dos herbicidas utilizados para matar plantas indesejáveis para a agricultura. O uso também está autorizado na capina química em estradas e sob redes de alta tensão, expondo ao risco de contaminação trabalhadores, comunidades e o meio ambiente, inclusive mananciais que fornecem água para os trabalhadores e para a população.
Com a medida, o órgão espera inibir a produção, exportação, importação, comercialização e utilização de agrotóxicos com o componente, mundialmente reconhecido como nocivo à saúde dos trabalhadores, dos consumidores e do meio ambiente.
A atrazina foi proibida na União Europeia em 2003, em razão dos níveis encontrados na água não serem considerados seguros, ainda que lá os limites permitidos sejam muito inferiores aos admitidos no Brasil. Em 2012, a atrazina foi proibida na Suíça, país sede da empresa Syngenta, que desenvolveu o herbicida e continua produzindo e exportando o produto.
Autorizado no Brasil, o princípio ativo ocupou o 5º lugar nas vendas em 2021, somando 37.299 toneladas, o que representa cerca de 5% do total dos cerca de 400 produtos registrados no país.
Robustos estudos científicos indicam que a atrazina pode causar doenças crônicas graves e irreversíveis como alterações hormonais, problemas reprodutivos, comprometimentos neurológicos motores, cognitivos e comportamentais, diminuição das funções imunológicas, além de conter propriedades cancerígenas. Trabalhadores expostos no ambiente de trabalho na agricultura mostraram aumento do risco de incidência do linfoma não-Hodgkin. Também há evidências do maior risco de câncer de mama, tireoide, rins e próstata.
Segundo os procuradores e as procuradoras do MPT que integram o GEAF que conduz o processo, Pedro Serafim, Carolina Pereira, Ileana Neiva, Alessandro Santos, Bruno Choairy, Charles Lustosa, Edson Beas e Leomar Daroncho, “a introdução no mercado brasileiro do agrotóxico com o princípio ativo atrazina coloca em risco a saúde e a segurança de grande número de trabalhadores e indígenas, especialmente no meio rural, além do meio ambiente laboral e do meio ambiente natural, contaminando o solo e mananciais de água que abastecem as comunidades”.
Assim, a decisão do TRT10 é saudada pelos Procuradores como uma sinalização importante da sensibilidade da Justiça do Trabalho com a necessidade de efetividade da proteção ao meio ambiente do trabalho.
Com informações de assessoria
Wagner Sales – Editor de conteúdo