Quando criança, sempre que olhava para a Serra da Mantiqueira, via um gigante adormecido. Itaguaré, no Tupi, significa “Pedra Sagrada” ou “Pedra Rachada”, mas é também apelidado de “Gigante Adormecido”. Conta-se a lenda de uma indefesa tribo de índios “puri”, que significa “gente mansa, pacífica”, que vivia em harmonia na sagrada Serra da Mantiqueira. Ele estava sempre ali, imenso e majestoso, deitado de barriga para cima, como se estivesse tirando uma soneca interminável.
A luz do sol iluminava suas encostas e, com o tempo, ele se molhava com a chuva e secava sob o calor do sol, como se estivesse se preparando para mais um dia de descanso. Eu costumava passar horas observando aquela figura colossal. Para mim, era um amigo silencioso, guardião das histórias e dos segredos da região. O verde das árvores que cobriam seu corpo parecia dançar com o vento, e as nuvens que passavam por cima dele pareciam ter medo de acordá-lo.
Nunca ouvi seu ronco, mas em minha imaginação, ele devia ter um ronco profundo, como o trovão distante, entre as montanhas. Às vezes, quando a neblina se espalhava, eu gostava de imaginar que ele estava sonhando. Quais seriam seus sonhos? Seriam aventuras por terras longínquas? Ou talvez ele sonhasse com as crianças que, como eu, se maravilhavam com sua presença? Eu me perguntava se, em seus sonhos, ele explorava o mundo além das montanhas, conhecendo outros gigantes e contando histórias de sua vida eterna.
A cada estação, o gigante se transformava. Na primavera, ele se vestia com flores coloridas que brotavam em seus campos. No verão, as árvores cheias de folhas verdes proporcionavam sombra e frescor. No outono, seu corpo se cobria com um manto dourado, enquanto no inverno, ele se vestia de branco, como se estivesse dormindo sob um cobertor de neblina. Cresci, mas o gigante da Mantiqueira nunca deixou de ser uma parte importante da minha vida. Sempre que sinto a necessidade de um momento de paz, olho para ele e lembro da sua serenidade.
O tempo passou, e agora, ao invés de apenas um menino sonhador, sou um adulto que, em meio à correria do cotidiano, busco refúgio nas pequenas coisas. E assim, mesmo em meio às responsabilidades e desafios, sempre que vejo a Serra da Mantiqueira, me lembro daquele gigante adormecido, que continua a se molhar e a se secar com o tempo, guardando em seu silêncio a sabedoria de eras passadas. Ele é um lembrete de que, mesmo em um mundo tão agitado, é essencial encontrar momentos para parar, respirar e simplesmente ser. E, com um sorriso, eu me pergunto: será que ele ainda sonha?
Denilson Costa.