Brasília (BSB) – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva acatou a sugestão do ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, e sancionou o projeto de lei nº 2.253, de 2022, vetando apenas o trecho que proíbe, por inconstitucionalidade, a saída temporária para visita à família.
“Entendemos que a proibição de visita às famílias dos presos que já se encontram no regime semiaberto atenta contra valores fundamentais da Constituição, como o princípio da dignidade da pessoa humana, o princípio da individualização da pena e a obrigação do Estado de proteger a família”, detalhou Lewandowski, num pronunciamento à imprensa no fim da tarde desta quinta-feira (11/4), “Preservamos todas as outras restrições estabelecidas pelo Congresso, como a necessidade de exame criminológico para progressão de regime e o uso de tornozeleiras eletrônicas”, completou o ministro.
Condenados por praticar crimes hediondos
Também seguindo parecer do ministro Lewandowski, o presidente sancionou o trecho que proíbe saída temporária para condenados por praticar crimes hediondos, com violência ou grave ameaça, a exemplo de estupro, homicídio, latrocínio e tráfico de drogas.
Na elaboração do projeto de lei, o Congresso optou por proibir a saída temporária para visita à família no mesmo dispositivo que veda a saída temporária para atividades de convívio social. Diante disso, não é possível o presidente vetar apenas a proibição de visita à família. O segundo item é “arrastado” para o veto, uma vez que a Constituição proíbe veto parcial em um mesmo dispositivo.
As saídas temporárias, regulamentadas pela Lei de Execução Penal, são concedidas, exclusivamente, a detentos do regime semiaberto que já tenham cumprido um sexto da pena total e que tenham bom comportamento.
Hoje, de acordo com os últimos dados da Secretaria Nacional de Políticas Penais, o Brasil tem hoje 118.328 presos em regime semiaberto. Desse contingente, nem todos estão aptos à saída temporária. Para que o condenado obtenha o “benefício” das saídas temporárias, é necessário preencher os requisitos estabelecidos na legislação, que serão analisados pelo juiz da execução penal.
Além disso, a medida não pode ser deferida sem a existência de um endereço fixo de pernoite do preso, bem como de mínimas garantias de retorno ao estabelecimento prisional ao término do período concedido. Ao todo, o Brasil tem 336.340 presos no regime fechado, que não estão aptos ao benefício.
Dignidade humana
Como explicitou o ministro Lewandowski, o veto do presidente Lula destaca que a extinção das hipóteses sociais para a saída temporária viola o princípio da dignidade humana da Constituição, que norteia a aplicação de todo o ordenamento jurídico, tanto no plano nacional como na assunção de compromissos internacionais por parte do Estado brasileiro.
A proteção ao convívio familiar e à dignidade do preso está amplamente prevista em acordos, convenções e protocolos internacionais dos quais a República Federativa do Brasil é signatária. Entre eles, a Declaração Universal de Direitos Humanos das Nações Unidas, de 1948; o Pacto Internacional Sobre Direitos Civis e Políticos das Nações Unidas, de 1966; a Convenção Americana de Direitos Humanos, de 1969.
Ou seja, a extinção ou mesmo a redução drástica das hipóteses de saídas temporárias distanciará o Estado das demais democracias liberais, representadas nos organismos internacionais, cujo esforço tem se dado no sentido oposto: a concretização dos direitos fundamentais e o estímulo, ainda que gradual, para a readequação do preso à vida em sociedade. O presidente também ressalta que a restrição das saídas temporárias, na forma apresentada pelo Projeto de Lei n. 2.253, de 2023, pode contribuir para o agravamento da situação carcerária, estimulando, por exemplo, rebeliões nas unidades prisionais.
Conhecida como saidinha, a saída temporária faz parte da Lei de Execução Penal, que entrou em vigor em 1984, após ter sido sancionada pelo general João Batista Figueiredo, último presidente da ditadura militar (1964-1985).
Na justificativa apresentada à época —e que ainda se encontra disponível no portal da Câmara dos Deputados —, o então ministro da Justiça Ibrahim Abi-Ackel argumentou que as saídas temporárias “constituem notáveis fatores para atenuar o rigor da execução contínua da pena de prisão”.
Abi-Ackel ressaltou que a medida serve para o preso “visitar a família, frequentar cursos na comarca da execução e participar de atividades que concorram para o retorno ao convívio social”. “As autorizações de saída representam um considerável avanço penalógico e os seus resultados são sempre proveitosos quando outorgados mediante bom senso e adequada fiscalização”, afirmou ainda o ministro, citando o livro “Prisión Abierta” (prisão aberta), do advogado e especialista no tema Elias Neuman.
No dia 25 de março, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil encaminhou ao Executivo parecer solicitando veto parcial ao projeto, sob o argumento de que “a ressocialização no meio familiar e em outras atividades de convívio social são de extrema importância para a reintegração social do apenado, pois o convívio com a família e com a sociedade pode ajudá-lo no processo de reinserção social. O Estado não deve evitar as relações familiares, mas sim procurar estimulá-las, reforçando os vínculos afetivos do condenado, com vistas à sua ressocialização e à pacificação social”.
Com informações de assessoria / PR
Wagner Sales – Editor de conteúdo